Especialistas discutem saúde emocional dos jovens: “Precisamos estar presentes de verdade”
O Brasil ocupa o nono lugar no mundo em incidência de depressão entre adolescentes e o oitavo em diagnóstico de ansiedade
Em meio aos preparativos para a cobertura internacional do Jubileu dos Jovens, que acontece em Roma a partir do próximo dia 28, o programa Jornal do Meio Dia abriu espaço para um debate urgente e necessário: a saúde emocional dos jovens e adolescentes no Brasil. Participaram da conversa a psicóloga Tatyane Varjão, a coordenadora do ensino fundamental do Colégio Santo Antônio, Lanny Miranda, e a mãe de dois adolescentes, Karine Lima.
O Brasil ocupa o nono lugar no mundo em incidência de depressão entre adolescentes e o oitavo em diagnóstico de ansiedade. “Essa é uma estatística triste, mas real e precisamos falar sobre ela com seriedade”, alertou a psicóloga.
Tatyane explica que a adolescência é, por natureza, um período de profundas transições, mas que a geração atual enfrenta um volume de estímulos sem precedentes.
“Antes, a gente ia até uma banca de revista. Hoje, o jovem tem tudo nas mãos. É muita informação e pouco conhecimento”, analisou. Para ela, muitos pais se veem perdidos: “Dizem ‘não fui criado assim’, e isso revela uma dificuldade de compreender a nova realidade dos filhos”.
A psicóloga também destacou que o excesso de redes sociais é um dos pilares, embora não o único, que agravam os quadros de depressão e ansiedade.
“Todo adulto tem seu lastro na infância e a forma como cada sujeito lida com a vida está atrelada a essa base. As redes sociais intensificam o isolamento e a comparação, dois elementos perigosos para a saúde emocional”, reforçou.
Lanny Miranda trouxe a perspectiva da escola e reforçou o papel da instituição no apoio emocional dos alunos.
“A escola é um pequeno laboratório da sociedade. A gente provoca interações, observa os sinais, e tem buscado cada vez mais aproximar as famílias para esse trabalho conjunto”, afirmou.
Ela citou o programa socioemocional implantado no Colégio Santo Antônio, que promove semanalmente discussões com os estudantes sobre sentimentos e emoções.
“Falar sobre si mesmo é difícil em qualquer idade, imagine na adolescência. A gente precisa ajudar esses jovens a encontrarem palavras para o que estão sentindo”, disse.
Além disso, a coordenadora mencionou a importância do esporte como ferramenta de desenvolvimento emocional.
“Incentivamos a cultura do esporte. Tivemos mais de 100 alunos participando de um campeonato intercolegial. Isso também é parte da formação do jovem”, afirmou.
Karine Lima, mãe de Arthur, de 11 anos, e Heitor, de 14, compartilhou sua vivência e defendeu o diálogo constante como chave para um relacionamento saudável com os filhos.
“Eu acredito que filho criado não é trabalho dobrado. Comecei a construir esse vínculo desde a infância. Entender sobre mim, sobre minhas emoções, me fez entender melhor meus filhos”, contou.
Ela ressaltou a importância da presença verdadeira. “Estar em casa não é o mesmo que estar presente. A gente precisa sentar, conversar, escutar de verdade. O comportamento dos meus filhos não é sobre eles, é sobre como eu, como mãe, reajo e interajo”, refletiu.
Karine também estuda o funcionamento do cérebro adolescente e usa esse conhecimento para compreender melhor os comportamentos dos filhos.
“Quando percebo que certos comportamentos fazem parte do desenvolvimento saudável, consigo lidar com mais empatia e menos confronto”, explicou.
O debate também abordou os crescentes casos de automutilação entre adolescentes. Tatyane chamou a atenção para dados da Fiocruz, que indicam aumento de 6% nas taxas de suicídio e de 29% nas automutilações entre jovens de 10 a 24 anos na última década.
“É preciso entender que o adolescente dá sinais. Muitas vezes ele está isolado, trancado no quarto, e os pais acham que isso é normal da fase. Mas esse isolamento pode ser um grito de socorro silencioso”, alertou.
Ela reforçou a importância da comunicação não violenta como forma de estabelecer conexões mais saudáveis.
“Dizer ‘eu estou cansada’, ‘eu não estou dando conta’ é uma forma de abrir diálogo, de mostrar vulnerabilidade e construir confiança”, afirmou.
Lanny complementou, ressaltando que a escola atua de forma preventiva ao observar comportamentos e chamar as famílias para conversar.
“Às vezes os pais não percebem o que está acontecendo em casa, mas a escola nota e aí é hora de unir forças”, disse.
O debate terminou com uma reflexão provocadora trazida por Karine: “Às vezes achamos que estamos próximos porque estamos na mesma casa, mas a distância emocional é imensa. Precisamos estar presentes com qualidade, com escuta e com afeto”.
Tatyane fez um chamado à consciência: “A saúde emocional do jovem depende do estilo de vida. Sono, alimentação, relações saudáveis e, sobretudo, presença. A ausência de vínculos, de valores, de escuta, leva ao adoecimento. Precisamos olhar para esses adolescentes com mais empatia e menos julgamento”.