Dia da Consciência Negra: Historiador destaca a importância na luta por reparação e reconhecimento no Brasil
Para o historiador Vicente Gualberto, o contexto histórico dessa data revela cicatrizes profundas de um passado escravocrata que ainda ecoa na sociedade brasileira.
Nesta quarta-feira, 20 de novembro, o Brasil celebra o Dia da Consciência Negra, uma data que transcende o feriado e convida à reflexão sobre as contribuições, lutas e desafios enfrentados pela população negra. Para o historiador Vicente Gualberto, o contexto histórico dessa data revela cicatrizes profundas de um passado escravocrata que ainda ecoa na sociedade brasileira.
“Nós fomos o maior país escravista do mundo e o último grande país a abolir a escravidão. Usamos a mão de obra escrava por quase 400 anos como alavanca para o desenvolvimento nacional. Porém, a abolição veio sem oferecer um alicerce para essa população, deixando-a órfã de direitos e cidadania”, explica o historiador.
Segundo Gualberto, a Lei Áurea, de 1888, proclamou a liberdade, mas não estabeleceu mecanismos para integrar a população negra à sociedade.
“Após a abolição, o Estado adotou uma política de negação de cidadania. A Lei da Vadiagem, por exemplo, ainda em vigor, foi criada para criminalizar negros libertos que não tinham condições de trabalho formal.”
A construção do Dia da Consciência Negra está diretamente ligada à valorização dessa história. O historiador destaca que a escolha de Zumbi dos Palmares como símbolo não é por acaso.
“Zumbi representa a luta pela liberdade e pela cidadania. Ele personifica o esforço de um povo que foi arrancado de sua terra, mas que construiu a cultura e a identidade do Brasil”, ressalta.
A questão racial e o reconhecimento oficial
Para Vicente, é crucial entender que a consciência negra não se trata apenas de uma questão racial, mas de reconhecimento histórico e cultural.
“Consciência não tem cor, mas é fundamental lembrar que não somos um país branco. Mais de 54% da população brasileira se autodeclara preta ou parda. Somos um povo plural, e essa pluralidade está intrínseca em nossa cultura.”
O historiador critica a demora para tornar o 20 de novembro um feriado nacional. “É vergonhoso que um estado como a Bahia, com sua rica população negra, tenha demorado tanto para reconhecer a data. São Paulo foi pioneiro, e só agora, com a iniciativa do presidente Lula, ela se tornou feriado nacional. Esse reconhecimento é uma reparação simbólica, um passo importante para valorizar essa população que construiu o Brasil.”
O racismo e a importância da valorização
Nos últimos anos, o professor aponta para uma preocupante “perda do pudor” em manifestar racismo.
“O racismo sempre existiu, mas antes era disfarçado. Hoje, vemos uma face despudorada, cínica e cruel, que não esconde sua aversão à população negra. Isso torna ainda mais relevante a existência de uma data como essa, que reafirma a identidade e o valor dos negros no Brasil.”
A riqueza da cultura afro-brasileira, para ele, é uma das maiores heranças deixadas pelos povos que vieram ao Brasil de forma forçada.
“Algumas palavras, expressões culturais e a força do candomblé, estão profundamente enraizadas no Brasil. Reconhecer isso é reconhecer a essência de quem somos.”
No Dia da Consciência Negra, o apelo é claro: além de celebrar, é preciso refletir sobre as desigualdades e o racismo estrutural que ainda persistem. Como afirma Vicente Gualberto, “essa população precisa se sentir valorizada, reconhecida e identitária. Isso é essencial para construir um país mais justo e inclusivo”.
*Com informações do repórter Robson Nascimento