Feira de Santana

‘Cartas Para um Anjo’: Escritora traz à tona o poder da escrita no enfrentamento do luto

Quezia transforma sua dor em missão

13/06/2025 21h03
‘Cartas Para um Anjo’: Escritora traz à tona o poder da escrita no enfrentamento do luto

A dor de perder um filho é inimaginável. Para a professora e escritora Quezia Carneiro, essa dor virou um caminho de reconstrução pessoal e deu origem ao livro Cartas Para um Anjo, lançado no último dia 30 de maio, no Museu de Arte Contemporânea de Feira de Santana. A obra é uma coletânea de cartas escritas por ela durante um ano, como forma de dialogar com o filho Gabriel, que faleceu em um acidente de carro aos 21 anos.

“Foi um momento muito especial, está sendo especial falar sobre esse livro, que eu chamo de meu filho-livro”, disse Quezia. “Durante muito tempo, a gente vive o luto, passa por momentos em que nem sabe mais o que é sorrir e o livro tem me trazido essa alegria. Eu tenho me sentido feliz novamente.”

Gabriel faleceu no dia 9 de novembro de 2020. Ele voltava de uma festa e estava em um carro com amigos quando o acidente ocorreu na Avenida João Durval, em Feira de Santana. O uso de bebida alcoólica e a ausência do cinto de segurança foram fatores determinantes no ocorrido. Quezia relembra com dor o momento em que recebeu a notícia.

“No início, eu achei que ele estivesse dormindo na casa do pai ou de algum amigo. Quando o pai dele apareceu na minha casa chorando, eu já senti que algo muito ruim havia acontecido. Pedi tanto a Deus para me devolver meu filho, de qualquer forma, mesmo que em estado vegetativo. Depois, entendi que aquele pedido era egoísta. Meu menino era cheio de vida, ele não merecia uma vida sem viver.”

Após a perda, a dor se misturou à insônia, ao desespero e à culpa. Foi a escrita que trouxe um fio de luz.

“Eu usava as redes sociais como forma de desabafo. Uma médica da minha igreja, Dra. Vanessa, me apresentou a escrita terapêutica. Foi aí que tudo começou. Fiz um compromisso com meu filho: escrever uma carta para ele todos os dias, até completar um ano da sua partida.”

Essas cartas, que começaram como registros diários em seu celular, foram se acumulando e se transformaram na base do livro.

“A primeira carta foi um resumo dos primeiros 15 dias, escrita no dia 27 de novembro. A última, escrevi exatamente um ano depois, em 9 de novembro de 2021.”

A carta mais difícil? Sem dúvida, a primeira. “Ali eu conto sobre a chegada ao hospital, a escolha da roupa para enterrar meu filho, o momento no cemitério. Foi um texto tão doloroso que nem quero reler. Mas as outras cartas são pedacinhos de lembranças que eu quis guardar. Tenho pouca memória e queria ter algo que me permitisse reviver a vida dele.”

Quezia compartilhou o impacto do luto em sua vida, nos relacionamentos e na saúde mental.

“Eu tive raiva de tudo: dele, de mim, de não ter sido mais severa, de não tê-lo impedido de sair. São perguntas que machucam: por que não colocou o cinto? Por que não pegou um Uber? A gente entra num ciclo de culpa e dor.”

Foram dois anos afastada do trabalho, enfrentando depressão e insônia. “Demorei a aceitar que precisava de ajuda. Sempre fui a mulher que cuidava de tudo, de todos. Me custou entender que era hora de ser cuidada. Hoje faço terapia, aceito os remédios para dormir. Ainda sofro, mas entendo que o luto deixa cicatrizes. Que seja com ou sem remédio, mas com fé e esperança.”

Mesmo diante de tanta dor, Quezia encontra propósito na escrita e no legado que deixa através do livro.

“Acredito que a missão do meu filho foi cumprida e este livro estende essa missão, ajudando jovens a não cometer os mesmos erros e dando esperança para mães que acham que não podem mais sonhar.”

O livro já foi lançado em Feira de Santana e tem uma agenda intensa: participará da Flifs (Feira do Livro da cidade), da FLIPELÔ, da Flis (em Sergipe), da Bienal do Livro do Rio de Janeiro e da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty).

“Vamos também organizar um lançamento na minha igreja, a Batista Alvorada. Será mais um momento de compartilhar essa missão.”

Para quem está vivendo o luto, Quezia deixa um recado. No final de seu livro, ela responde à pergunta que mais escuta: o que dizer a quem está no fundo do poço? Ela escreve:

“Quando estiver no fundo do poço, não hesite em puxar a corda. Peça ajuda. Não tente ser forte e corajosa quando o mais sensato é se deixar cair no deserto e ser cuidado por Deus, pelos seus afetos, pelos médicos. Minha corda mais densa foi a fé, depois o amor e o sonho. Qual a sua?” E conclui: “Assim vou vivendo: feliz para sempre — e nem sempre tanto.”

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