Feira de Santana

Caminhoneiro relata uso de medicamentos para driblar o sono e especialista alerta para risco coletivo

O problema vai muito além de um caso isolado.

08/06/2025 19h30
Caminhoneiro relata uso de medicamentos para driblar o sono e especialista alerta para risco coletivo

Durante participação no Jornal do Meio Dia da Rádio Princesa FM, um depoimento do caminhoneiro Robson Luiz, de 29 anos, revelou uma realidade silenciosa e extremamente perigosa que afeta milhares de motoristas de carga em todo o país. Ao lado da nutróloga e especialista em sono, Dra. Anne Stephany, ele relatou os efeitos do uso indiscriminado de medicamentos para se manter acordado por dias seguidos. O resultado: um grave desequilíbrio físico e mental que quase custou sua vida.

“Eu cheguei a passar 45 dias sem dormir direito. Rodando direto de Fortaleza a São Paulo, parando no máximo 20 ou 40 minutos para cochilar. Era remédio atrás de remédio, sem controle, tudo por causa da pressão para cumprir metas e garantir o financeiro”, contou Robson. “Tinha alucinação, espasmos, via coisa que não existia. A mente não processava mais. Era como se o corpo tivesse presente, mas a cabeça, não.”

A situação levou Robson a sofrer um acidente próximo à cidade de Escada, em Pernambuco.

“Eu não estava com sono, mas tive um apagão. Quando acordei, já estava atrás de uma carreta. Tentei desviar, fui para o canteiro e o caminhão tombou. Felizmente, não houve vítimas, só danos materiais”, relatou.

A virada na vida de Robson começou quando soube que seria pai.

“Quando descobri que minha esposa estava grávida, tudo mudou. Comecei a ter medo. Será que vou ver minha filha nascer? Meu pai morreu num acidente de caminhão. Eu pensei: será que vou repetir esse ciclo e deixar essa dor para minha filha?”

Foi então que Robson buscou ajuda e conheceu a Dra. Anne Stephany.

“Na consulta, ela me perguntou: ‘Valeu a pena?’. Todo aquele dinheiro que ganhei, comparado ao que perdi de saúde mental e física, não valeu. Isso me fez repensar tudo.”

Para a Dra. Anne, o caso de Robson é um alerta urgente.

“É um susto muito grande. A gente estuda a Medicina do Sono e sabe que existem medicamentos psicoestimulantes que têm uso específico para quadros clínicos como hipersonolência patológica, mas o que vimos aqui é diferente: o uso dessas substâncias sem prescrição, de forma abusiva e com doses absurdas. Ele me relatou o uso de remédios utilizados para TDAH em quantidades perigosíssimas, muito além do que a medicina considera aceitável.”

A médica destaca que muitos desses medicamentos são adquiridos de forma clandestina e sem qualquer tipo de regulamentação.

“Robson me disse: ‘Quando o remédio era bom, durava mais. Quando era só farinha, eu precisava tomar vários de uma vez’. Isso é gravíssimo. Estamos falando de uma situação de saúde pública.”

E o problema, segundo ela, vai muito além de um caso isolado.

“Quando perguntei para Robson quantos caminhoneiros ele conhecia que passavam pela mesma situação, ele me respondeu: ‘Oito ou mais em cada dez’. Isso é assustador. Estamos falando de milhares de vidas em risco nas estradas brasileiras, não só dos motoristas, mas de todos nós que dividimos a pista com eles.”

A entrevista também trouxe uma reflexão pessoal da especialista.

“Hoje, quando compro algo em um site e fico ansiosa para que chegue no dia seguinte, eu penso: quem é que vai dirigir esse caminhão? Em que condição essa pessoa está? Precisamos repensar nossa relação com a velocidade e a produtividade. Qual o custo disso tudo?”

Dra. Anne reforçou que não se trata apenas de alertar os motoristas, mas toda a sociedade e, principalmente, o poder público.

“A fiscalização sobre a jornada desses profissionais precisa ser real. Precisamos de políticas públicas, de educação em saúde, de apoio psicológico. Não dá para normalizar que um trabalhador passe cinco dias sem dormir por causa de uma carga. Isso mata.”

Robson, por sua vez, deixa uma mensagem de conscientização: “Eu espero que minha história sirva de alerta. Eu quase não vivi para ver minha filha nascer. Hoje, meu propósito de vida mudou. E se alguém que está ouvindo isso agora está passando pela mesma coisa, pare e pense: o que realmente vale a pena?”.

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