Psicóloga destaca impactos da ausência paterna e caminhos para a reconstrução dos vínculos
Segundo a psicóloga, a criança é, inicialmente, uma extensão da mãe, e o pai tem o papel simbólico de apresentar essa criança ao mundo externo
Em uma entrevista especial ao Jornal do Meio Dia, da Rádio Princesa FM, em homenagem ao Dia dos Pais, a psicóloga clínica e hospitalar Julinda Cardoso, especialista em Gestalt-terapia e psicopedagogia, com mais de 17 anos de experiência, trouxe reflexões sobre o papel do pai na formação emocional dos filhos e os danos provocados pela ausência paterna.
“A ausência do pai na vida dos filhos traz consequências graves para o desenvolvimento emocional e psicológico. A figura paterna não é apenas uma presença, mas uma referência de segurança, aventura e coragem para enfrentar o mundo”, afirmou Julinda.
Segundo a psicóloga, a criança é, inicialmente, uma extensão da mãe, e o pai tem o papel simbólico de apresentar essa criança ao mundo externo, favorecendo o desenvolvimento da autoconfiança e da capacidade de enfrentar desafios sociais.
“A criança só se sente realmente segura do ponto de vista psicológico quando está em um ambiente confortável. Quando essa zona de conforto é rompida sem a figura do pai como referência, surgem dificuldades como insegurança, baixa autoestima e até problemas em iniciar novos empregos ou frequentar uma nova escola”, completou.
Julinda alertou sobre o cuidado necessário no modo como a figura paterna é apresentada à criança, especialmente em casos de separação ou abandono.
“Esse pai pode ser ausente por falecimento, abandono, ou até por estar fisicamente presente, mas emocionalmente distante. A forma como a mãe e a rede de apoio falam dele influencia diretamente a maneira como a criança internaliza essa figura. Apresentar o pai como um monstro ou como alguém que não presta só reforça a fratura emocional”, explicou.
Ela reforçou que esse tipo de fratura pode se refletir em quadros de depressão, ansiedade, dificuldade de estabelecer relacionamentos saudáveis e até tendência a se envolver em relações abusivas ou de dependência afetiva.
Há mais de 11 milhões de mães solo no Brasil, segundo estudos recentes. Julinda afirmou que, apesar da realidade dolorosa da ausência paterna, é possível quebrar esse ciclo com apoio psicológico e ressignificação das experiências.
“Muitos filhos crescem nutrindo raiva e sentimento de abandono. O primeiro passo é olhar para suas dores, entender seus sentimentos e buscar formas de transformar essa energia em algo positivo. Não estamos dizendo que é fácil, mas que é possível”, aconselhou.
Ela citou o exemplo de um jovem brasileiro, de 28 anos, que conheceu na Itália durante uma viagem recente. Mesmo tendo crescido sem o pai presente, o jovem se mostrou bem resolvido emocionalmente e profissionalmente.
“Muitas vezes, essa ausência move mais energia dentro da pessoa do que em filhos que cresceram com pai e mãe presentes, mas emocionalmente frios”, pontuou.
Questionada sobre casos em que há desejo de reaproximação, mas também medo e dor, Julinda enfatizou que, embora o passado não possa ser mudado, é possível construir um novo futuro:
“Se você é pai e deseja se reaproximar do seu filho, ou se é filho e quer dar uma chance ao reencontro, prepare-se para o melhor e para o pior. Mas permita-se viver essa experiência. Muitas vezes, esse pai que foi ausente também foi um filho de um pai ausente. Estamos falando de padrões repetitivos que podem ser quebrados com coragem e consciência”, destacou.
A psicóloga também destacou a importância de liberar o perdão:
“Perdoar não é esquecer o que aconteceu, mas dar a si mesmo a chance de seguir adiante. Baixar as armas, chamar para uma conversa e buscar ressignificar a relação pode mudar vidas. A dor da ausência paterna existe e deve ser acolhida, mas ela não precisa definir o futuro”, disse.
A psicóloga também lembrou que honrar os pais é um dever, mesmo que isso não signifique concordar com tudo:
“Filhos, olhem para a história dos seus pais, tentem entender o que eles viveram. Honrar não é passar pano, mas ressignificar com maturidade. Vocês podem ser a geração que quebra esse ciclo”, concluiu.